A loja maçónica Reforma, de Coimbra, que teve o vimaranense José da Cunha Sampaio
como primeiro Venerável, teve vida curta: iniciou a sua actividade no início de
1863 e deixou de funcionar a partir de Maio de 1864. A sua breve história foi
contada por Joaquim Martins de Carvalho, nos seus Apontamentos para História Contemporânea,
editados em 1868. Aqui fica:
No
princípio de 1863, vendo alguns membros da Sociedade do Raio, que depois dos acontecimentos do dia 8
de Dezembro de 1862 era impossível manter o mistério que are aí tinha
havido na mesma sociedade, e igualmente que haviam obtido o principal fim da
sua criação pelo facto de se ter retirado do governo da universidade o sr.
visconde de S. Jerónimo, trataram de reorganizar a sociedade, sobre outras bases, dando-lhe a forma maçónica.
A
maior parte porém dos académicos que haviam pertencido a sociedade do Raio não
tomaram parte em a nova organização maçónica.
As
primeiras reuniões preparatórias foram numa casa em Celas no princípio do mês
de Fevereiro de 1863, e no fim do mesmo mês mudaram as reuniões para o colégio
da Estrela nesta cidade.
Poucos
dias aí se conservaram, e no mês de março mudaram-se para as casas da rua do
Norte, pertencentes ao sr. Gonçalo Telo. Nesse local continuaram as suas
reuniões e admissões de novos membros, conseguindo regularizar-se no dia 27 de
maio do mesmo ano sob os auspícios do Gr.·.O .·. da Conf .·. Mac .·. Port .·.,
e tomando o nome de loja Reforma. Foi eleito Vener.·. o estudante do 3.°
ano de direito, José Bento da Cunha Sampaio.
Os fins da organização da loja - Reforma eram conseguir o ensino
livre como em França, a reforma das leis académicas, e dar união e força a toda
a academia. Além disso, como era Gr.·. M.·. o sr. José Estêvão Coelho de
Magalhães, pretendiam por intermédio dele estabelecer relações com o governo
presidido pelo sr. duque de Loulé.
A loja Reforma foi funcionando até maio
de 1864. Algumas
desinteligências que se tinham suscitado entre esta loja e a loja
Liberdade, de que adiante falaremos, já tinham sido motivo de desgostos,
mas ultimamente ocorreu uma
circunstância que fez de todo acabar a Reforma. Em 28 de setembro de 1863 tinha nascido o príncipe herdeiro
D. Carlos, e por isso no dia 18 de Abril de 1864 houve uma grande reunião de
académicos, que, fundando-se na prática seguida por ocasião do nascimento de
outros herdeiros da coroa, resolveram encarregar uma comissão de fazer uma
representação ao governo, pedindo a concessão do perdão de acto. Efectivamente
se redigiu a representação, que foi assinada pelos membros da comissão os srs.
Joaquim José Maria de Oliveira Vale, Pedro Victor de Sequeira, Casimiro António
Ribeiro, Henrique de Bessa e Manuel de Oliveira Chaves e Castro.
A comissão dirigiu-a ao reitor da
universidade, o sr. dr. Vicente Ferrer Neto de Paiva, que então estava em
Lisboa, a fim de a entregar ao ministro do reino, o sr. duque de LouIé.
O
sr. Ferrer, respondendo à comissão,
e dando-lhe parte de que havia feito entrega da representação ao ministro do reino, acrescentava: - e
como bom procurador ponderei a favor dela tudo quanto a minha inteligência me
sugeriu.
A academia estava assim quase convencida
de que lhe era concedido o perdão de acto; e por isso foi
grande a sua surpresa, quando soube que o ministro do reino, em portaria de 26 do mesmo mês de abril, indeferira
a sua pretensão.
Esta
portaria produziu na academia um efeito extraordinário. Além do indeferimento,
queixavam-se da forma desabrida como ele era dado. Reuniram-se os académicos no
seu teatro. e decidiram representar as cortes e protestar contra a apreciação
que o ministro do reino fizera da academia de Coimbra.
O estado de excitação dos estudantes
e algumas assuadas que houve por essa ocasião, fizeram com que a
autoridade superior reclamasse aumento de força. Efectivamente no dia 29 de Abril chegou a Coimbra vindo do Porto um batalhão de 200 praças
de infantaria 5. Com a chegada da tropa ainda mais ofendida se julgou a
academia. Reuniram-se outra vez no seu teatro e resolveram reclamar da
autoridade a saída do batalhão. Como porém não lhes fosse deferida a sua
reclamação, deliberaram abandonar a cidade, marchando para o
Porto, à imitação do que já os académicos em 1854 tinham feito, indo
para Tomar.
Logo
na madrugada do dia 30 de Abril saíram no comboio para o
Porto mais de 200 académicos, e seguidamente foram indo outros, sendo poucos
os que ficaram na cidade. Por alguns dias se conservaram no Porto, de onde
voltaram pelas diligências para isso empregadas por alguns cavalheiros, e pelos
amigáveis conselhos do vice-reitor, o sr. conselheiro José Ernesto de Carvalho
e Rego.
Os
membros da loja Reforma eram na sua quase totalidade de opinião
contrária a que a academia fosse para o Porto, mas não puderam evitar esse
passo. Tiveram até de acompanhar os seus condiscípulos por espírito de
camaradagem.
A
estes acontecimentos se seguiu o acabamento da loja Reforma, que depois
do mês de Maio de 1864 nunca mais tomou a funcionar.
Joaquim Martins de
Carvalho, Apontamentos para História Contemporânea, Coimbra, Imprensa da Universidade, 1868, pp. 269-271
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