Sinais



Ao lermos comentários como o que vai aí abaixo, temos que nos perguntar: não haverá, entre os responsáveis políticos, quem saiba interpretar os sinais que andam no ar e perceber que é a imagem de Guimarães que está a ser posta em crise?


Questões de capital

Depois da polémica dos cartazes promocionais, que faziam passar a ideia - apelativa, mas pateta - de que o sucesso do evento dependia de roubar turistas ao Algarve, a Guimarães 2012 - Capital Europeia da Cultura (CEC) voltou às bocas do mundo, por más razões. A revelação de que os vencimentos dos salários dos três administradores executivos da Fundação Cidade de Guimarães (FCG), criada para organizar o evento, variam entre os 14.300 e os 12.500 euros mensais, e de que os membros do conselho geral da instituição recebem entre 500 e 300 euros por reunião, provocou um coro de críticas. Um coro no qual foi bem perceptível a participação do Ministério da Cultura, que, pela voz da própria Gabriela Canavilhas, considerou aqueles salários "inaceitáveis". Juntou-se a notícia de que a Câmara de Guimarães pagou 30 mil euros - num ajuste directo que o bom senso desaconselharia - pela elaboração de uns estatutos para a FCG que são criticados no conselho geral, por preverem que a fundação se eternize, sobrevivendo ao evento que lhe deu a razão de ser, e por darem estreita margem de intervenção (e responsabilização) à câmara e ao Ministério da Cultura. Por último, ouvimos esta semana o presidente da Câmara de Guimarães acusar a ministra da Cultura de ver o projecto da CEC como um "enteado".

Dir-se-ia que é um preâmbulo pouco auspicioso para a Guimarães 2012, que deve ser um momento de afirmação e promoção da cultura nacional, que deixe sementes. Mas ainda há tempo para corrigir boa parte dos erros cometidos. Aos responsáveis autárquicos e governamentais exige-se responsabilidade e que superem divergências. Da reunião já pedida pela câmara à comissão de vencimentos da FCG, espera-se que saia uma redução corajosa das despesas com pessoal. 1,3 milhões de euros anuais em salários, que diabo, é de facto chocante, atendendo a que não estamos propriamente a falar de uma Autoeuropa. É dar argumentos àqueles que, por ignorância, demagogia ou por ambas, acreditam e fazem passar a ideia de que a Cultura é uma gamela. E vencimentos superiores a dez mil euros, pagos pelo erário público, ofendem o comum dos cidadãos. Nem é tanto por estarmos em crise, é por se perceber que também foi assim que chegamos a ela. O presidente da Câmara de Guimarães já disse que os salários na FCG são semelhantes aos praticados noutros organismos do género. Nós acreditamos, mas isso é que assusta.

Comentário de Álvaro Vieira, no Público de hoje

Assobiar para o lado não é remédio, quando o que está em causa é o prestígio de Guimarães e a sua imagem, francamente positiva, projectada ao longo de muitas décadas. Esse património colectivo tem que ser acautelado. É urgente resolver o que houver a resolver. Corrigir o que houver a corrigir, minimizando os danos. E depois, que o processo retome o seu curso natural, como aquilo que sempre foi, antes de tudo o mais: um grande desígnio de Guimarães e dos vimaranenses.

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4 Comentários

Anónimo disse…
Sabe o que é mais lamentável? Que os estatutos retirem qualquer possibilidade a quem paga (o Estado central, sobretudo o Min da Cultura) de ter qualquer intervenção, quer no que respeita aos escandalosos vencimentos, quer até no que se refere às intervenções artisticas a programar. E que o presidente da Câmara, responsável pelo escandalo, se tenha sentido "ofendido" por a ministra da cultura, zelando pelo que é do Estado (de todos nós), ter considerado "demais", e ter partido aliás logo para a baixa politica, acusando a ministra de não ser a mãe da Fundação e por isso a tratar como enteada. É o mal de certos presidentes estarem há demasiado tempo, julgam que são os donos disto e que até os ministros lhes têm que vir à mão! Mas enganam-se.
Anónimo disse…
Tanta conversa e, afinal, vem-se a saber que quem escolheu Cristina Azevedo para presidente da Fundação Cidade de Guimarães foi o notável conselho de notáveis da F. C. de Guimarães, como o revela o presidente da Câmara, em entrevista à Lusa:
Magalhães mostra-se determinado em manter a gestora à frente da Fundação, dizendo mesmo que não quer que se vá embora: “não foi ela que se ofereceu, foi o Conselho Geral que a convidou devido ao seu currículo e à sua experiência e especialização quer em questões culturais quer em relações internacionais”, sublinha
V. exa, que diz coisas neste blog, também lá está, no tal Conselho Geral. Ou não? Portanto, a responsabilidade também é sua.
Acho curioso o facto de se dizer que a senhora foi escolhida devido ao "ao seu currículo e à sua experiência e especialização quer em questões culturais quer em relações internacionais". Pelo que se pode saber, a senhora dra. Cristina Azevedo tem formação de base em relações internacionais económico-políticas, com especialização em Análise Financeira. Quanto à suposta experiência e especialização em questões culturais, não percebo onde a foram os senhores do Conselho Geral da F. C. de Guimarães descobrir. No seu currículo, nada consta dentro do género.

J. Pedro Alves
Exmo. Senhor J. Pedro Alves,

Não serei eu a enjeitar as minhas responsabilidades, onde as tiver. Acontece que, nesta matéria, nem eu, nem o Conselho Geral da Fundação Cidade de Guimarães, tivemos qualquer intervenção, pelo que acredito que a informação que aí se transmite só se possa dever a lapso de quem redigiu a notícia, uma vez que o presidente da Câmara de Guimarães sabe, melhor do que eu, que o Conselho Geral nada teve a ver com a nomeação dos presidentes dos órgãos da FCG. Quando foram empossados os membros daquele Conselho, já a presidente da Fundação estava em funções. Em caso de dúvidas, aconselho a leitura dos estatutos daquela entidade, que são públicos.
Filipe Soares disse…
Caro Pedro Alves, a CRistina Azevedo, mais que um curriculo, tem excelentes padrinhos políticos, a verdade é esta. A sra. tem uma carreira feita à base do Partido (PS), aliás na linha de outros que pertencem à fundação, mas isso até seria secundário caso o curriculo, aquilo que verdadeiramente interessa, tivesse sido alicerçado e especializado em questões culturais, o que efectivamente não foi, o que torna a sua escolha ainda mais enigmática.....mas talvez por isso a Fundação está como está.

Filipe Soares