Tendo chegado à certeza de que Afonso Henriques nasceu, exactamente, dois anos e nove meses antes da morte de seu pai, tendo concluído ser “facto irrefutável” a presença de D. Teresa em Viseu (ali retida ou impedida devido ao seu estado fisiológico, como o autor afirma repetidamente), nos meados do Verão de 1109, e tendo assente a data do foral de Azurara da Beira, que, de presumível, rapidamente se transforma em verdade segura, Almeida Fernandes afirma, positivamente e sem hesitações, “que foi nessa altura, à roda de 5 de Agosto de 1109, que no paço de Viseu veio à luz o nosso primeiro Rei, D. Afonso Henriques” (p. 140). Eis aqui a tese de Almeida Fernandes para o nascimento do filho de Henrique e Teresa: uma construção artificiosa e especulativa, assente em premissas não demonstradas, ou comprovadamente inexactas e arrevesadas, que resulta de um curioso processo de “prestidigitação autoral”, como diria o seu autor.
Almeida Fernandes, que classifica, com razão, a Crónica de Cinco Reis, do século XV, como um texto “em que as fantasias se misturam com as verdades e os erros com acertos”, nota, porém, que “as coisas não partem do nada”, querendo dizer que qualquer fantasia tem um fundo de verdade, não resistiu a transcrever um trecho daquela obra, adaptando-o de modo a servir a sua argumentação:
“Como Dom Egas Moniz soube que a rainha parira cavalgou mais asinha e veio-se a Guimarães (leia-se Viseu) onde o Conde era e pediu-lhe por mercê que lhe desse o filho que lhe nascera para o haver de criar assim como prometido lho havia”. (p. 143).
Ou seja, pode-se inferir que, para Almeida Fernandes, neste trecho, tudo será verdade, excepto ter sido Guimarães o palco do acontecimento.
Porém, se se aceita que “as coisas não partem do nada”, terá que se conceder que a tradição secular que dá Guimarães como pátria de Afonso Henriques pode ter algum fundamento, admitindo como provável o que dizem todas as crónicas que narram a vida e a obra do nosso primeiro rei. O que é discutível é que se reescrevam essas crónicas colocando Viseu em posição em que nunca esteve, como Almeida Fernandes faz no trecho acima citado. Recorrendo ao artifício que o autor usou para o excerto Crónica dos cinco Reis de que se socorreu, poderíamos, certamente que com maior razoabilidade, adaptar um naco da sua própria prosa:
“Carece, pois, de um mínimo de base documental, e muito menos se funda em documentos directamente, a opinião de que D. Afonso Henriques nasceu em Guimarães (leia-se Viseu)” (p. 14).
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