Sobre o anúncio do 'chumbo' dos projectos para Toural e o Mercado Velho

O recente anúncio de que o IGESPAR teria informado, por via de parecer informal, que seria contrário à concretização dos projectos para o Toural e para o antigo mercado merece alguma reflexão.

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O Toural. Gravura publicada no "Archivo Pittoresco", 7.º ano (1864), pág. 217.

Em relação ao projecto para o Toural, do meu ponto de vista, já aqui amplamente exposto, seria mais do que natural o chumbo do parque subterrâneo e do túnel previsto no projecto que tem estado em cima da mesa. Não faltavam argumentos para desaconselhar essas intervenções. Já o mesmo não direi se se fala em restrições draconianas em relação a eventuais intervenções à superfície. Ao longo dos séculos, o Toural já teve muitas caras. Parece consensual a ideia de que a nossa sala de visitas está, há muito, a pedir uma intervenção de requalificação. Se essa intervenção for desenvolvida dentro da mesma lógica conceptual que esteve presente nas intervenções que, ao longo das últimas décadas, tiveram lugar no miolo do Centro Histórico, não estou a ver quais possam ser as suas contra-indicações.


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O mercado em 1908 (feira dos chapéus)

Quanto ao projecto para o Mercado Velho, ao que leio, as objecções do IGESPAR resultam de aquele espaço se situar “numa zona sensível, junto a um monumento nacional, a Igreja de S. Domingos, e por prever o desaparecimento de espécies arbóreas de elevado valor”. Ora, a bem do rigor, convirá precisar que a Igreja de S. Domingos de Guimarães ainda não está classificada como monumento nacional. Está classificada como Imóvel de Interesse Público desde Maio de 1959. Monumento nacional é, desde 1910, o Claustro de S. Domingos, onde está instalado o Museu Arqueológico da Sociedade Martins Sarmento. Desde 1960, este monumento está resguardado por uma Zona Especial de Protecção, que, a partir de 1974, abrange toda a rua de D. João I.

A requalificação do Mercado Velho é necessária e é urgente. Sem uma intervenção que lhe deite a mão, aquele espaço, agora abandonado, tenderá a morrer, a entrar em decomposição e a transformar-se numa bolsa de degradação no coração da cidade. Por outro lado, a ideia de o transformar numa nova centralidade, aliviando a pressão sobre as praças intramuros, cuja "capacidade de carga” é ultrapassada, muitas vezes, para lá dos limites do desejável (em especial à noite), tem que ser encarada positivamente. Começa a ser consensual a noção de que uma das principais linhas orientadoras das intervenções no Centro Histórico (requalificar o Património sem o musealizar e sem expulsar os moradores, contrariamente ao que aconteceu em tantos outros sítios) está em risco, por força da agitação nocturna que invade as nossas velhas praças, em especial ao fim-de-semana. O Mercado Velho, pela sua configuração física e por se situar razoavelmente afastado de espaços habitacionais, poderá absorver boa parte dessa vitalidade, permitindo reduzir os níveis de desconforto que afectam uma população cada vez mais envelhecida.

Se se vier a demonstrar que a construção do edifício que acolherá a futura da Casa da Memória, previsto para a ala sul do Mercado Velho, não será viável, por estar dentro da zona de protecção ao conjunto do claustro de S. Domingos (MN), da Igreja de S. Domingos (IIP) e da Rua de D. João I (IIP), a solução poderá passar por transferir o novo edifício para a ala voltada a poente, num espaço já fora do perímetro de 50 metros da zona de protecção e integrado na Zona Especial de Protecção que envolve todo o Centro Histórico.

O suposto problema com as árvores, até porque o projecto prevê a preservação dos elementos arbóreos mais nobres, é um falso problema.

Declaração de interesse: o autor destas linhas esclarece que tem interesse no projecto da Casa da Memória, por se contar entre aqueles que conceberam a ideia original que lhe subjaz. Mais esclarece que o seu interesse não comporta qualquer componente financeira ou profissional.

Post scriptum: a propósito do anúncio de que aqui se trata, este debate dá que pensar.

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