Notícias da Exposição Industrial de Guimarães de 1884 (1)


A Exposição Industrial de Guimarães de 1884 teve grande ressonância na imprensa local, regional e nacional daquela épica. Entre as inúmeras notícias que então se publicaram, destaca-se uma longa, detalhada e muito interessante reportagem publicada em 18 números do
Jornal de Comércio, de Lisboa, de que a seguir se transcreve um excerto, onde se descreve a génese da Exposição e se dá conta da intervenção destacada que nela teve Alberto Sampaio, que nesse mesmo ano daria os seus primeiros passos como historiador, nas páginas da Revista de Guimarães. Os textos publicados no Jornal do Comércio são do Dr. Avelino da Silva Guimarães, da Sociedade Martins Sarmento e profundo conhecedor da indústria vimaranense.


"(...)

Estas considerações; o conhecimento do valor industrial dos povos do concelho de Guimarães, moderados no salário, sujeitos a trabalho até ao sacrifício; a decadência que se manifesta em parte das antigas indústrias vimaranense; - inspiraram a SOCIEDADE MARTINS SARMENTO a promover, já a concentração do espírito público de Guimarães para o estudo do estado precário da sua indústria, já o emprego de esforços para que o governo realizasse a fundação de estabelecimentos de instrução técnica, decretados desde 1864.

Com estes fins beneméritos, a Sociedade fundou os dois cursos nocturnos de francês e desenho, nomeou comissões de comerciantes, fabricantes e consócios, para procederem a inquéritos parciais por classe de indústria, realizou uma conferência pública na sala da biblioteca, tomando por tema – a importância da indústria vimaranense, e meios de a melhorar –, e resolveu se promovesse uma Exposição Industrial puramente concelhia.

A criação dos cursos nocturnos realizou-se facilmente, graças ao desinteresse e altos dotes cívicos dos dois professores; a Exposição teve largas e variadas dificuldades a vencer.

Teve o pensamento, o projecto da direcção dois anos de incubação. A Sociedade carecia de meios para fazer face às despesas; alguns receavam-se de tudo, e nem sequer esquecia como argumento de impugnação, a necessidade de dar à Exposição, não o aspecto modesto da simples exibição dos produtos fabris, mas o aspecto ornamental das grandes exposições nacionais. O ornamental, como dizia Spencer, preferindo ao útil!

Dois factos recentes resolveram os ânimos mais tímidos: a inauguração do caminho-de-ferro de Guimarães, e a criação da escola industrial da Covilhã; aquela aquecendo e progredindo pela ideia de progresso, esta agitando pelo sentimento de um agravo. A direcção da Sociedade convidou uma assembleia geral de proprietários, comerciantes e industriais. Presidiu o ilustre consócio, o Sr. conde de Margaride.

O projecto da Exposição foi recebido com entusiasmo. Por deliberação desta assembleia, organizou-se uma comissão central composta inteiramente de sócios da SOCIEDADE MARTINS SARMENTO: os Srs. barão de Pombeiro (presidente), dr. António Coelho da Mota Prego (presidente da Câmara), Manuel de Castro Sampaio (administrador do concelho), visconde de Lindoso, directores da Sociedade: dr. José da Cunha Sampaio, António Augusto da Silva Carneiro, António José da Silva Basto, dr. Avelino Germano, dr. Avelino da Silva Guimarães, Domingos Leite de Castro (autor da primeira proposta para a Exposição), Adolfo Salazar, dr. Joaquim José de Meira, dr. Domingos de Castro Meireles, Manuel de Freitas Aguiar, José Miguel da Costa Guimarães e Eugénio da Costa Vaz Vieira; José Martins de Queiroz, dr. Alberto Sampaio, A. A. da Silva Caldas, dr. Luís Augusto Vieira, António José Pinto Guimarães, Domingos José de Sousa Júnior, Manuel Ribeiro de Faria, I. de Menezes, Domingos Martins Fernandes, José Ribeiro da Silva e Castro e João Dias de Castro.

Organizada a grande comissão central, começaram de convidar-se classes de comerciantes e industriais, para os ouvir e consultar acerca do melhor método a seguir para o plano da Exposição.

Foi convidado o Sr. dr. Alberto Sampaio para organizar o projecto do programa e regulamento.

Depois de decorridas bastantes semanas, depois de tomado o espírito de algum imprevisto desânimo, depois de ter exercido um certo domínio no ânimo do público a acção perniciosa dos retrógrados, uns sinceros, outros pelo velho achaque da maledicência, a maioria da comissão refez-se de coragem, resolveu vencer todas as dificuldades, e levar por diante o plano da Exposição.

Organizaram-se duas comissões: numa assembleia-geral, uma comissão de meios, composta dos sócios os Srs. padre João Gomes de Oliveira Guimarães, Domingos Martins Fernandes, Eduardo Almeida e António José Baptista Guimarães; numa sessão da comissão forma-se uma subcomissão executiva, composta dos Srs. dr. Alberto Sampaio, presidente, Domingos Leite de Castro, Domingos Martins Fernandes e Manuel Ribeiro de Faria. A comissão central abre uma subscrição para receita, e subscreve com largueza; a subcomissão de meios consegue em poucos dias abundante receita por subscrição pública. A Câmara subscreveu com 200$000 réis; a companhia do caminho-de-ferro com 100$000 réis.

A animação arrasta a todos, o entusiasmo renasce no comércio e na indústria, o patriotismo dos cidadãos vimaranenses aviva intensamente, uma polémica jornalística acerca da criação da escola de desenho incendeia ainda mais, por se reputar insuficiente pela a riqueza e variedade industrial de Guimarães. A subcomissão executiva confere ao dr. Alberto Sampaio pleno arbítrio na direcção técnica para a organização da Exposição. A comissão central conheceu que em trabalhos desta ordem há sempre necessidade duma certa concentração de poderes, da energia duma direcção superior. Escolheu para este fim, e acertadamente o Sr. dr. Alberto Sampaio, nomeando-o presidente da subcomissão executiva.

O dr. Alberto da Cunha Sampaio é dotado de inteligência viva e muitíssimo cultivada, especialmente em estudos económicos. Sem ocupações profissionais, cheio de ardor e de brio, caracteristicamente trabalhador, agora convencido até ao entusiasmo da oportunidade da Exposição, a comissão não podia fazer melhor escolha para director técnico desta exibição sistemática e concentrada da riqueza industrial de Guimarães.

Assumindo esta direcção, o dr. Alberto Sampaio desenvolve a máxima actividade, visitando as casas de comércio, as fábricas e oficinas, animando a todos, resolvendo dúvidas, organizando, enfim, o quadro das indústrias concelhias. Nas conjunturas mais graves, mais por satisfação aos seus consócios, que por necessidade, consulta a comissão central.

Consegue-se do Sr. António de Moura Soares Veloso, gerente da companhia do caminho-de-ferro de Guimarães, a cessão do palacete de Vila Flor, situado em posição vantajosa, e próximo da estação do caminho-de-ferro.

Convidam-se os numerosos expositores a escolherem lugar para as suas instalações, pela maior parte feitas a expensas próprias.

Sendo muito numerosos, havendo uma grande variedade de classes de indústrias, poucas e pequenas as salas para tão desenvolvida Exposição, imaginem-se os esforços que o director técnico teve de fazer, as indicações prudentes e engenhosas que foi necessário usar, para que todos ficassem bem, e todos satisfeitos.

(...)"

[Também publicado aqui]

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