Pormenor do portal da capela de São Lázaro |
Há
quem defenda que a razão de ser de Guimarães é a veiga de
Creixomil, cuja fertilidade atraiu, fixou e sustentou a antiga vila
de Guimarães. Na memória que escreveu em 1758, o seu pároco não
ignorava a riqueza das suas terras, quando escreve que “os
seus campos e terras chamados as Lameiras do Miradouro são
fertilíssimos, no tempo que estão desafrutadas têm sempre água de
lima e nunca se lhes deita esterco para darem milho”.
Creixomil
O padre
Francisco Fernandes Cruz, vigário da freguesia de São Miguel de
Creixomil, subúrbios da vila de Guimarães, Arcebispado de Braga
Primaz, satisfazendo a uma ordem do Muito Reverendo Senhor Doutor
Provisor do mesmo Arcebispado que, com o papel incluso, me foi
entregue, a qual respondendo e dando razão informo o seguinte.
É esta
freguesia da Província de Entre-Douro-e-Minho, do Arcebispado de
Braga, comarca e termo da vila de Guimarães. Não é terra de
donatário.
Tem
vizinhos ou fogos trezentos e vinte e cinco, tem oitocentas e vinte
pessoas de sacramento.
Está
situada num vale dos melhores dos subúrbios da vila, os seus campos
e terras chamados as Lameiras do Miradouro são fertilíssimos, no
tempo que estão desafrutadas têm sempre água de lima e nunca se
lhes deita esterco para darem milho, pois, estercando-se, põe mais
na palha que no fruto, e o estercá-las é mais prejudicial que útil.
Não se
descobrem dela mais povoações, por ficar em vale, como digo.
Não tem
termo seu, pertence ao da vila de Guimarães.
A igreja
está fora de lugar, tem só dois vizinhos.
Os nomes
de seus lugares são Rua da Madroa, Sabacho, Castanheiros, Rua da
Cruz de Pedra, Santo André, Salgueiral, Robalo, Laços, Eiras,
Honras, Dardos, Costeado, Trasgaia, Fornos, São Lázaro, Pombais,
Ribeiras, Porcariça, Casa Nova, Souto dos Mortos, Miradouro, Torres,
Rabiços, Tapado, Pontes, Moucos, Selho, Rei de Vides, Lajes,
Boavista, Bouça, Pinheiro, Carrazedas, Codeceiras, Assento da
Igreja.
O seu
orago é São Miguel. Tem a igreja cinco altares. O maior é de São
Miguel, o do Menino Deus, o da Senhora do Rosário, o de Santo
António e o das Almas. Não é de naves, a igreja. Tem quatro
irmandades, a do Menino Deus, da Senhora do Rosário, a de Santo
António e a das Almas. É o pároco desta freguesia vigário ad
nutum, é
apresentação do reverendo chantre da Colegiada da vila de
Guimarães, o Doutor Francisco José Pereira. Come o mesmo padroeiro
a dizimária, que há-de importar em perto de seiscentos mil réis.
Para o pároco que a cura, renderá sessenta mil réis, fora as suas
ordens. Não tem beneficiados.
Não tem
conventos, nem também hospital, nem misericórdia.
Tem cinco
capelas, o distrito desta freguesia. A de São Lázaro, que tem
romagem em domingo de Lázaros, e na mesma capela se festeja a
Senhora da Ajuda, em dia da Anunciação, que também tem romagem, e
na mesma capela se festeja Santa Marta, em vinte e nove de Julho, com
sua romagem. Tem a de Santo André, em que se festeja o Santo no seu
dia, com concurso de muito povo da vila de Guimarães e das aldeias.
São estas duas capelas da administração da Santa Casa da
Misericórdia. Tem mais a da Senhora da Luz, que se festeja no dia da
Purificação, por António Manuel Vaz Vieira de Melo e Alvim Pinto,
por obrigação do seu morgado, o qual instituiu seu tio Jerónimo
Vaz Vieira de Melo, Desembargador do Paço. Há, no mesmo dia,
romagem grande e, no fim da missa da festa, se canta seu responso de
música pela alma do mesmo Desembargador. Há outra capela, dos Reis
Magos, que é de José Bezerra de Abreu e Lima, e outra de São
Caetano, que é de Dona Rosa Maria Peixoto dos Guimarães, da Quinta
de Laços, cabeça do seu morgado. Não têm estas duas romagens e as
duas capelas de São Lázaro e dos Reis Magos ficam na mesma rua de
São Lázaro e a de Santo André fica entre vizinhos, a da Senhora da
Luz fora do lugar, a de São Caetano dentro da Quinta de Laços.
Os frutos
desta freguesia são trigo, centeio, milho branco e milhão. O que se
colhe em mais abundância é milhão, há vinho bastante, mas
bastantemente verde, há pouco azeite e fruta.
Não tem
juiz ordinário, está sujeita às justiças de Guimarães.
Não é
couto, nem cabeça de concelho, nem comarca.
Não há
notícia que dela saíssem homens insignes em virtudes, letras ou
armas.
Não tem
feira.
Não tem
correio, aproveita-se do da vila de Guimarães, que parte na
sexta-feira para o Porto, distante desta oito léguas, e chega no
domingo à noite.
Dista
esta freguesia da cidade de Braga, capital do Arcebispado, três
léguas, e de Lisboa, capital do Reino, sessenta léguas.
Não há
nesta freguesia antiguidades, privilégios ou coisas dignas de
memória.
Não tem
fonte ou lagoa que sejam célebres as suas águas.
Não é
porto de mar.
Não é
esta freguesia murada, nem praça de armas, nem tem torres ou castelo
algum.
Não
padeceu esta freguesia ruína alguma no terramoto de mil e setecentos
e cinquenta e cinco.
Não tem
esta freguesia serra ou montados e, por isso, os moradores dela não
têm estrumes e, se os querem, os compram nas freguesias vizinhas.
Passa por
esta freguesia um pequeno rio, a que chamam o rio de Selho. Compõe-se
de quatro regatos, um que nasce na freguesia de São Romão de Mesão
Frio e, passando pela ribeira de Santa Maria de Atães, aí se junta
com outro, que nasce no mesmo monte de Atães, e, unidos aí na dita
freguesia, os dois regatos vêm correndo pelo distrito da mesma
freguesia, até ao lugar que chamam Vila Franca ou Rua Franca, e, no
mesmo lugar, se lhe juntam outros dois regatos, um que vem de São
Cosme da Lobeira e outro de São Torcato, o Velho, e, juntos ali
todos os quatro regatos, aí recebe o nome de Rio de Selho, por
passar por entre a freguesia de São Mamede de Aldão e São Lourenço
de Cima de Selho, onde tem uma ponte de cantaria, e, assim vindo
correndo pelos distritos das freguesias de São Pedro de Azurém e
Santa Eulália de Fermentões, entra por terras desta freguesia, no
Inverno com curso arrebatado e de Verão com pouca água e quieto em
toda a sua distância. Corre de Norte a Sul.
Cria
peixes, que são escalos e bogas, desde o seu nascimento até à
freguesia de São Jorge, que é uma das vizinhas a esta, metendo-se
só em meio a de Santa Maria de Silvares e já aí na de São Jorge
de Cima de Selho cria bons barbos e trutas, principalmente onde
chamam os Sumes do rio de Selho e aí, nesse lugar ou sítio dos
Sumes, corre o mesmo rio por baixo da terra e penedos, sem se
divisarem suas águas, por irem subterrâneas.
Os peixes
que cria são os mais gostosos de todos quantos criam os rios
vizinhos. Não há no seu distrito pescarias particulares. Em todo o
ano se pesca neles.
Cultivam-se
as suas margens. Tem muitas árvores de vinho ao pé e muitos
choupos.
Não se
sabe que tenham virtude suas águas, conserva sempre o nome até se
meter no rio Ave e todo o seu curso terá de distância légua e
meia, isto é, do sítio de onde toma o nome de rio de Selho até se
meter no rio Ave, abaixo da ponte de Serves, e aí, onde entra no
Ave, perde o nome, juntando-se com o mesmo rio, que é grande.
Não é
este navegável, tem muitas levadas e represas. Tem nesta freguesia
uma ponte de cantaria e outra de padieiras, uma do lugar de Selho, e
por isso chamada a ponte de Selho, e outra de padieiras no lugar de
Trepecido e por isso chamada a ponte de Trepecido.
Tem, no
distrito desta freguesia, vinte e cinco moinhos e, destes, seis
alveiros. Não tem pisões, lagares de azeite ou outro algum engenho
no distrito desta freguesia, só na de São Mamede de Aldão tem dois
engenhos de azeite e, na de São João de Pencelo, tem outro engenho
de azeite.
Nunca de
suas áreas se tirou ouro.
Usam os
povos do seu distrito livremente de suas águas e as freguesias por
onde passa são as seguintes, isto é, desde que tem o nome de rio de
Selho: São Romão de Mesão Frio, São Mamede de Aldão, São
Lourenço de Cima de Selho, São Pedro de Azurém, São João de
Pencelo, Santa Eulália de Fermentões, São Miguel de Creixomil,
Santa Maria de Silvares, São Jorge de Cima de Selho, São Cristóvão
de Cima de Selho e freguesia de Serzedelo onde tem, aí perto, uma
ponte de cantaria chamada o Arquinho do Soeiro. Tem outra de cantaria
na freguesia de Santa Eulália de Fermentões, que parte com esta de
São Miguel de Creixomil, chamada a ponte de Caneiros. Tem mais uns
pontidos nas freguesias vizinhas, de que os reverendos párocos de
seus distritos darão melhor razão.
Já disse
que, desde o distrito de onde toma o nome de rio de Selho até o
perder na entrada do rio Ave, ocupará légua e meia.
É isto o
que posso dizer e informar e, vai conferido com os dois reverendos
párocos mais vizinhos, que são o de São Sebastião da vila de
Guimarães, José Luís Ferreira, e o de Santo Estêvão de Urgezes,
Custódio António de Sousa.
Hoje, São
Miguel de Creixomil, 30 de Abril de 1758 anos.
O pároco
Francisco Fernandes Cruz.
O padre
Custódio António de Sousa.
O pároco
José Luís Ferreira.
“Creixomil”,
Dicionário
Geográfico de Portugal
(Memórias Paroquiais), Arquivo Nacional-Torre do Tombo, Vol.
12, n.º 460, p. 3229 a 3233.
[A
seguir: Urgezes]
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