Verde, que te quero verde

Antes
Sou um bicho urbano. Cresci entre o granito, muito granito, o betão e algum alcatrão. Só sou capaz de identificar pelo nome meia dúzia de árvores e das vozes dos pássaros só distingo algumas, apesar de um dia ter preparado um livro muito bonito, de Alberto Vieira Braga, sobre o canto das aves. Até estes dias, vivia num lugar que, sendo na cidade, quase semelhava a vida duma aldeia das antigas. Ali ao lado, uma antiga taberna onde se matam as horas da tarde a jogar chincalhão, entre malgas de vinho e o linguajar colorido da nossa gente. Mais ao fundo, lá para o miolo da Caldeiroa, a paisagem enrameava-se de verde. Era dali que vinham os sons que compunham a banda sonora do meu adormecer e do meu despertar. Cucos, corujas e o galo matutino que nunca falhava a hora. E, especialmente ao romper do dia, o cantar de diferentes pássaros que não sei identificar e que me iam dizendo que já era tempo de acordar. Tudo isso está a morrer, de uma morte estúpida. Estão a matar a minha aldeia na cidade. Por estes dias, o que me acorda são os apitos sincopados e irritantes do bulldozer que está a destruir um quarteirão verde, para o encher de betão e de automóveis. Era uma vez uma Cidade (que já foi) Verde.

Agora. Amanhã, será pior.

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