Efeméride do dia: Primeira eleição de João Franco

João Franco castelo Branco (1855-1929)

29 de Junho de 1884
Eleições constituintes no país, sendo eleito pelo círculo de Guimarães o imposto deputado regenerador João Franco Ferreira Pinto Castelo Branco por 3261 votos, e mais teria se os periódicos locais da mesma cor política não reclamassem ao povo que elegesse um vimaranense (havia descontentamento geral porque os últimos deputados, também impostos, foram nulidades que nem a Guimarães vieram), indicando-lhe o dr. Alberto Sampaio, o grande e incansável trabalhador que conseguira a realização da brilhante 1.ª Exposição Industrial, o qual teve 190 votos, Tomás Bastos, progressista, 1334, Sena Freitas 98, Alves Mateus 66, José Guilherme 658, Mariano de Carvalho 4, Alves da Veiga, republicano 2, Miguel Augusto Pacheco 2, Costa Simões 1, D. José de Saldanha 230, Alberto de Campos Henriques 1, listas inutilizadas 10. Só o Alberto Sampaio era vimaranense, os outros eram de cascos de rolha que andavam a pescar nas águas turvas. Foi a 1.ª vez que Guimarães elegeu o João Franco.
(João Lopes de Faria, Efemérides Vimaranenses, manuscrito da Biblioteca da Sociedade Martins Sarmento, vol. II, p. 312 v.)

No dia 24 de Maio de 1884 foram dissolvidas as Cortes, marcando-se eleições de deputados para o dia 29 de Junho. Logo em Guimarães se começaram a levantar vozes contra a imposição de candidatos estranhos à terra, como vinha acontecendo, fazendo com que os vimaranenses não se sentissem representados pelo deputado que elegiam. O jornal O Comércio de Guimarães foi o principal porta-voz destas preocupações. No mesmo dia em que anunciava a data das eleições, fazia um apelo para que os vimaranenses escolhessem um deputado que os “representasse condignamente no Parlamento, argumentando:
Não precisais de ir com uma lanterna na mão procurara terras estranhas um homem para vos representar; intramuros, tendes cavalheiros ilustradíssimos, que honram pelos seus conhecimentos a independência e o berço da monarquia portuguesa.

Nas edições seguintes, repetia-se este apelo.Na edição do dia 22 de Junho, lemos:
Eleger um deputado estranho à localidade, e antipatriótico e indigno dum povo que acaba de evidenciar a sua vitalidade e o seu progredir nesse magnífico e imponente certame, que vai assinalar na história do país a renascença da indústria vimaranense.
Somos tão patriotas, tão sinceros, que não perdoaríamos a nós próprio, o silêncio, se acaso não fosse eleito um cavalheiro vimaranense.
Acima da política, das conveniênciias, de tudo, está a nossa terra, a nossa dignidade!
Eleger um deputado estranho à localidade, é desconceituar os cavalheiros,que nos podem representar em cortes e é lançar um labéu sobre o povo de Guimarães. (…)
Não nos importa que o nosso deputado seja grego ou troiano, regenerador, constituinte, progressista ou republicano; o que nos importa é que seja um filho desta terra, apto para defender os interesses da localidade que representa.
É mister que a cidade de Guimarães remova de si a tutela que lhe tem imposto em algumas candidaturas deputados estranhos.
O concelho de Guimarães tem muitos indivíduos, muitos cavalheiros dignos da nobre missão e do augusto mandato deste povo.
Não os apontamos, porque todos os conhecem.
À urna, pois, vimaranenses, por um filho de Guimarães!

Por aqueles dias, Guimarães andava nas páginas de todos os jornais nacionais. A Exposição Industrial concelhia, pela sua dimensão e pelo seu carácter pioneiro causou grande impacto, e havia uma figura que se destacava: Alberto da Cunha Sampaio, o homem que recebera da Sociedade Martins Sarmento a missão de organizar o certame. Na sua edição de 28 de Junho, a revista Ilustração Universal dedicava-lhe a primeira página, onde publicava o seu retrato e um texto onde se destacavam as suas qualidades:
Alberto Sampaio foi o pontifex magnus daquelas litanias do trabalho, e por isso a Ilustração Universal lhe dá o lugar de honra neste número, comemorando assim os serviços por ele prestados à indústria nacional nesta festa, que tanto honra o concelho de Guimarães, como os seus primorosos artistas.
No final de Junho de 1884, o nome de Alberto Sampaio começava a ser avançado como o do filho de Guimarães que os vimaranenses queriam ver como deputado.
No entanto, no dia das eleições, acabaria por prevalecer o velho sistema da imposição partidária, bem oleado pela acção dos caciques locais. O candidato do Partido Regenerador, qualquer que ele fosse, era aquele que, de longe, estava melhor posicionado para ser eleito. E os regeneradores, que em Guimarães eram comandados por Francisco Agra, impuseram um candidato que era desconhecido em Guimarães e que desconhecia a cidade, os seus problemas e os seus anseios. Tinha 29 anos, era natural de Alcaide, no Fundão e chamava-se João Franco Castelo Branco. 
No dia das eleições, que noutras terras foi marcado por violência e mais de uma dezena de mortes, em Guimarães houve sossego. A votação não trouxe qualquer surpresa. Dos 5867 votos válidos contados, João Franco obteve mais de metade (3261). Foram contados 190 boletins de voto em Alberto Sampaio. A frieza dos números parece dar razão aos que falam na ingratidão humana. O filho da terra, Alberto Sampaio, apenas obteve 3% dos votos dos seus concidadãos, que votaram esmagadoramente em candidatos de fora.
No Comércio de Guimarães do dia 2 de Julho, escrevia-se:
À última hora tocou-se a rebate nos campanários políticos, e o povinho obedeceu em rebanho.
Muitos eleitores não foram à urna; outros votaram pelo imposto regenerador, outros pelo candidato progressista, e outros prestaram na urna a última homenagem a um nosso conterrâneo, cavalheiro modestíssimo, que empregou todos os esforços para que o seu nome não entrasse em lista alguma, obtendo, apesar disso, uma votação honrosíssima, eloquente e mui significativa.
Em algumas assembleias, alguns eleitores riscavam francamente o candidato  imposto  e inscreviam o nome de Alberto Sampaio.
Era assim que os eleitores respondiam à imposição dum deputado estranho que foi eleito sem apresentação alguma.

Sobre essas eleições e os seus resultados, já muito se tem dito. Citaremos, por exemplo, o historiador Manuel Alves de Oliveira, num texto que publicou em 1984, no Boletim dos Trabalhos Históricos, alusivo à passagem do primeiro centenário da célebre exposição:
Em 29 de Junho, catorze dias depois do acto inaugural da Exposição, a que dera o melhor do seu esforço e da sua boa vontade, realizaram-se eleições constituintes, tendo sido Alberto Sampaio proposto, por um grupo dos seus amigos, deputado pelo círculo de Guimarães. Porém, e contra toda a expectativa, o que vem comprovar o carácter volúvel e impressionável das multidões sempre abertas às falsas promessas dos políticos, Alberto Sampaio só conseguiu obter 190 votos, sendo então eleito o deputado apresentado pelo Partido Regenerador, João Franco Ferreira Pinto Castelo Branco, por 3 261 votos.
No entanto, a história desta eleição é um pouco diferente da que tem sido contada. Na verdade, Alberto Sampaio nunca foi candidato a deputado e o seu nome foi introduzido nas urnas de voto por um número significativo de vimaranenses num gesto de homenagem e, ao mesmo tempo, de protesto contra a imposição, pelos principais partidos, de nomes estranhos a Guimarães.
A ideia da candidatura a deputado de Alberto Sampaio surgira numa manifestação que os operários de Guimarães tinham organizado no dia 24 de Junho, em homenagem aos organizadores da Exposição Industrial. Sampaio agradeceu a lembrança mas rejeitou terminantemente a possibilidade de se candidatar a deputado. Na véspera das eleições, juntamente com o seu irmão José, procurou os que pretendiam votar no seu nome (que nem sequer constava das listas candidatas), dissuadindo-os. Mesmo assim, 190 eleitores escreveram o nome de Alberto Sampaio no boletim que introduziram na urna.

Entretanto, ao fim de dois anos, já Guimarães percebia que o imposto João Franco era melhor do que a encomenda…

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