S. Nicolau e Krampus |
Em 1846
estava o Minho em revolta. Eram os dias da Maria da Fonte. Muitos dos
acontecimentos mais marcantes destes tempos tumultuosos passaram por Guimarães.
Porém, as festas a S. Nicolau deste ano decorreram com normalidade. O pregão
deste ano saiu à rua acompanhado por mascarados ricamente vestidos,
nomeadamente os que personificavam Minerva, Vénus e a Fama. Foi escrito por
José Nepomuceno da Silva Ribeiro e lido pelo seu irmão Joaquim Fernandes da
Silva Ribeiro.
Não fora uma
referência nos dois primeiros versos (Alerta Guimarães, alerta, alerta! / Da
tristeza, que te oprime hoje desperta;) dir-se-ia que aqueles eram tempos de
absoluta normalidade em terras de Guimarães.
Bando escolástico – 1846
Alerta
Guimarães, alerta, alerta!
Da tristeza,
que te oprime hoje desperta;
Guimarães,
tu que aos reis deste o berço,
Pátria aos
heróis e leis ao universo,
Surge,
surge, veste hoje as galas tuas,
De rosas e
boninas junca as ruas,
Que para ti
alfim a volveu a custo
O sexto de
Dezembro, o dia augusto,
Dia em que
brilha a pompa, o fausto brilha,
E do
estudante à voz tudo se humilha.
Exulta
Guimarães, exulta, exulta,
Que a glória
para ti jamais se oculta.
E tu, ò
crespo Apolo, ò numen louro,
Sobre a
láctea corrente em nuvens d’ ouro
Corre, voa
em volver-te apressurado,
Para que o
grão dia, há tanto suspirado,
A Guimarães
volver, volver depressa.
Ninfas
gentis que do Ave a margem espessa
Aos sátiros
fugindo povoais,
Deixai secas
areias, que pisais,
Vinde todas
e cantar, vinde à porfia,
Lindas
canções ao despontar do dia,
E de capelas
mil ornada a fronte,
Mil choreias
formai no dia ingente.
Dia que
outro não conta a sábia história,
Dia pomposo
de eternal memória,
Que do tempo
o volver jamais enerva,
E vós, ò
filhos de ínclita Minerva,
Impávidos
heróis, que o mundo aclama,
Sustentai
com heroísmo a glória, a fama,
E com a
espada em punho, olá, fazei
Com valor
respeitar a vossa lei,
Que em prol
das regalias, alma e vida
Na arena a
perder, tudo vos convida.
Foge, foge,
ò corja proterva,
Não ouses,
não, aos filhos de Minerva,
De mil
fadiga, de mil lucubrações,
Roubar os
mais devidos galardões;
Foge infame,
aliás do lodo imundo
Ao tanque
baixarás já moribundo;
E, se a vida
Minerva carinhosa
Nesta te poupar
crise perigosa,
Nem de
eterno baldão, de opróbrio eterno,
É o ferrete
marcar-te o tetro Averno.
Amanhã só pertence ao estudante
Das damas
ofertar à mais galante,
A essa a
quem se esmerou a natureza,
Loura
castanha, a bela camoesa,
Tocar-lhe a
mão nevada e à voz de amor
De alma e
vida ficar-lhe devedor.
Oh! ventura
sem par, que o mundo espanta!
Levanta, ò jovem, tua voz, levanta,
Que as
ninfas belas vem entre alegrias
De puros
gozos matizar-te os dias!
E tereis vós acaso um coração,
Que insensível à voz da gratidão
Mil extremos
olvide, e não atenda
Da cara
juventude à pura oferenda?
Ah! vós que a própria Vénus na brandura,
No amor
venceis, venceis na formosura,
Sobre nós volvei olhar de afeição;
Traidoras não sejais, ingratas não.
Um suspiro,
um abraço, quem tal pensa!
É de uma maçã justa recompensa.
Eia avante, ò heróis, olá, marchemos,
A festa
nossa, à fama anunciemos.
Eia avante!
E ao clangor da tuba ingente
Retumbem cá no mundo eternamente
De Nicolau
os imortais louvores.
Rufai,
jovens, rufai nesses tambores,
E ao som de
acordes hinos triunfais
Subam ao céu
mil vivas festivais,
Seja d eles
Éolo pregoeiro,
Ouça-os a terra, o mar, o mundo inteiro.
FIM
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