A servidão de Cunha e Ruilhe (1)


Há uma velha tradição vimaranense, que envolve as freguesias de S. Miguel de Cunha e S. Paio de Ruilhe, actualmente pertencentes ao concelho de Braga, que tem gerado alguma discussão, por se situar algures entre a história e o mito. As dúvidas que persistem em relação a esta tradição não dizem respeito à sua existência, que está demonstrada, mas quanto à sua origem, que carece de ser esclarecida.

A tradição, que se cumpriu até ao ano de 1743, conta-se assim:

Durante séculos, três moradores daquelas freguesias (dois de Cunha e um de Ruilhe) vinham, sete vezes no ano, varrer a praça, o terreiro e o açougue de Guimarães. Esta era uma servidão a que todos os homens daquelas freguesias estavam obrigados, enquanto lá residissem, sendo cumprida rotativamente entre eles. Acontecia nas vésperas das sete festas do ano: Páscoa, Espírito Santo, Corpo de Deus, São João, Santa Isabel, Domingo do Advento e Nossa Senhora de Agosto. Aqueles a quem calhava em sorte o cumprimento desta servidão dirigiam-se à Câmara, onde eram forçados a envergar o trajo próprio da função: ali lhes davam uma opa vermelha ou barrete da mesma cor, de que caía uma ponta até ao talabarte, e a espada levavam e a metiam em um cinto armado à esquerda e os faziam descalçar um pé ficando com o outro calçado pondo-lhe ao cinto o sapato e meia que tinham descalçado. Como ferramenta, cada um levava sua vassoura de giestas. As ruas eram varridas sob a vigilância permanente de um guarda nomeado para o efeito, no meio da algazarra de grupos de rapazes que escarneciam dos varredores forçados. Cumprida a humilhação pública, os três penitentes devolviam à Câmara o barrete e restantes adereços que foram forçados a utilizar, dando-se por cumprido o tributo.

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