A Grande Guerra vista de Guimarães (1): O Atentado de Serajevo

O atentado de Serajevo, segundo uma gravura da época.
 Há 100 anos, neste dia 28 de Novembro aconteceu em Serajevo o incidente que ser viria de pretexto para a guerra que, havia muito, os europeus sabiam que ia acontecer, sem saberem quando nem como. Gravilo Princip, estudante sérvio pertencente à organização Mão Negra, depois de um atentado à bomba falhado, acabaria por cumprir a missão de que incumbira, aproveitando uma oportunidade que o acaso lhe entregou: abateu a tiro o herdeiro do Império Áustro-Húngaro, Francisco Fernando, e a sua esposa, a duquesa Sofia. Nos dias que se seguiram até ao final do mês de Julho, accionaram-se na Europa os mecanismos das alianças militares e começou a guerra que muitos previram que fosse curta, mas que seria longa de quatro anos e a mais sangrenta de todas as guerras até aí acontecidas desde que o Mundo é Mundo.
Arquiduque Francisco Fernando (1889-1914)
O atentado de Serajevo teve pouca repercussão na imprensa portuguesa. Por esses dias, no extremo ocidental da Europa as páginas dos jornais enchiam-se com inflamadas discussões de política interna, marcada pelas quezílias entre republicanos e monárquicos e entre diferentes facções dos republicanos. Assim acontecia em Guimarães. A notícia da morte de Francisco Fernando apenas aparece quinze dias depois, no “jornal independente” Castelo de Guimarães. Aqui fica:

O arquiduque assassinado

 O arquiduque Francisco Fernando, tão tragicamente assassinado, contava 51 anos de idade.
Era filho do arquiduque Carlos Luís, já falecido, irmão do imperador, e da arquiduquesa Maria da Anunciada, princesa da casa das Duas Sicílias.
Quando tinha nove anos, morreu a sua mãe e por esta razão foi educado, bem como seus irmãos, pela terceira esposa de seu pai, a princesa Maria Teresa de Portugal.
Ao terminar os seus estudos ingressou no exército e percorrei todos os graus até chegar a generalíssimo, posto que lhe concedeu ultimamente o imperador.
Por educação e por temperamento era um carácter essencialmente militar e contava muitos e entusiastas partidários entre os seus subordinados.
Precisamente o arquiduque se encontrava em Serajevo para dirigir as grandes manobras que se deviam fazer naquela região.

Prisão de Gravilo Princip (1894-1918), após o atentado
Quando jovem, fez uma excursão à Índia para caçar tigres, voltando de tal modo doente que se viu na necessidade de viajar pelo litoral do Adriático, fazendo estânicas no Cairo, Argélia e Córsega, recobrando a saúde.
Estava casado com a condessa Sophia de Choteck, filha do embaixador da Áustria em S. Petesburgo.
A família imperial opôs-se a este casamento, pela desigualdade do enlace, que afinal se realizou com a protecção do imperador, concedendo à condessa o título de duquesa de Hohemberg.
A condessa de Choteck era natural de Stuttgart, capital do estado de Wurtemberg, na Alemanha, e contava 46 anos de idade.
Ficam do infortunado matrimónio uma filha e dois filhos.
Francisco Fernando era um homem activo, inteligente e enérgico.
A energia, aliada à bondade de sentimentos e à afabilidade no trato, era a sua qualidade mais saliente.
Anelava a prosperidade da sua pátria e era o auxiliar mais eficaz do imperador, que lhe confiava o estudo dos mais árduos negócios do Estado.

O novo herdeiro

Herda os direitos ao trono o sobrinho do arquiduque Francisco Fernando, o arquiduque Carlos Francisco José, de 27 anos. É filho do falecido arquiduque Otto.
Há três anos que casou com a princesa Zita de Bourbon de Parma, de quem tem uma filha.
O imperador tem por ele uma especial predilecção.
Tem um irmão de 19 anos, o arquiduque Maximiliano Eugénio Luís.

Castelo de Guimarães, 12 de Julho de 1914

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