Estão de volta, do fornecedor habitual. Agora, as nêsperas vão ficar a sorvar, até ganharem aquele ar decadente, a raiar podridão, que não é mais do que um processo de amadurecimento que as levará ao ponto em que serão consumidas. O que será feito delas, ainda não sei. mas não faltam alternativas .
Um dos problemas da nêspera é a estreita janela de tempo em que pode ser consumida, o que faz com que se perca uma boa quantidade deste fruto tão antigo e tão especial. No entanto, há maneiras de o conservar, acrescentando-lhe valor. Já vimos como se faz geleia de nêspera, agora veremos como se transformam as nêsperas sorvadas numa conserva de fruta com a consistência e o aspecto da marmelada, embora com um sabor algo diferente. Os ingleses chamam-lhe medlar cheese mas, ao contrário do verdadeiro queijo, não é feito com leite, mas sim co…
E depois há Nespereira, a freguesia do Concelho de Guimarães onde, há mais de um século, Raul Brandão e Maria Angelina decidiram construir a sua casa. Será que o nome lhe vem da árvore das nêsperas? A acreditar no que escreveu o pároco de Santa Eulália de Nespereira, o vigário Francisco Rodrigues Cardoso de Assis, na resposta que deu em 5 de Maio de 1842 ao Inquérito Paroquial concelhio, o nome da freguesia seria uma corruptela do nome de uma mulher nobre, proprietária de boa parte dos bens da freguesia. Diz ele: O orago desta fre…
Por estes dias, têm-me chegado comentários curiosos: dizem-me que esta história da nêspera é muito interessante, mas que não será ela que os levará a alterarem a sua disponibilidade para levarem aquele fruto às suas mimosas bocas. São os que, por comerem com os olhos, não se atrevem a provar um fruto que parece podre. Por outro lado, para além do preconceito, o calendário também não é muito propício para que a nêspera tenha um valor económico significativo, já que a janela de tempo em que está em condições de ser consumido é muito estreit…
Natureza morta com três nêsperas (c. 1696-1705), de Adriaen Coorte. A nêspera e a sorva (fruto da sorveira) são as personagens do poema Medlars and Sorb-Apples , incluído na obra Birds, Beasts and Flowers, de D. H. Lawrence (1885-1930), publicado pela primeira vez em 1923, e que tem sido classificado como o melhor livro de poesia do prolífico autor de O Amante de Lady Chatterley . Nesse poema complexo, carnal e pulsante ( Adoro sorver-te das tuas peles / Tão castanha e macia e deslizando delicada ), Lawrence joga com os opostos ilusórios…
Oh, Romeu, fosse ela, oh, fosse ela / u m etecetera aberto, e tu uma pêra poperina! A nossa nêspera aparece em quatro obras de William Shakespeare (1564-1616), o maior de todos os dramaturgos e o mais notável escritor de língua inglesa. A nêspera tem, em Shakespeare, diferentes significados e representações simbólicas, que vão desde a figuração de fealdade dos seres humanos, seja física ou de carácter, à representação do que jamais amadurecerá antes de apodrecer ou a referências explícitas aos actos e instrumentos da sexualidade huma…
No início desta série de textos dedicada a esse fruto quase esquecido, escrevi que a nêspera tem muita história e muita literatura. Agora, vou começar a explicar porquê. A forma, a consistência e o processo de maturação da nêspera prestam-se a metáforas, trocadilhos e eufemismo que remetem, nomeadamente, para jogos sexuais e para a fragilidade da condição humana, que diversos escritores trabalharam nas suas obras. No Novo Diccionario das Linguas Portugueza e Franceza , de José Marques, publicado em 1764, encontrei um provérbio que remet…
Isto não é um magnório (imitando Magritte). Durante largos séculos, em Portugal, o vocábulo nêspera designava, exclusivamente, o fruto castanho, globuloso, acídulo e mole, que, depois de colhido, era acondicionado sobre palha durante algumas semanas, para concluir o seu processo de maturação. No território que hoje é Guimarães, já havia uma “villa nesperaria” no ano 973, a Nespereira de Raul Brandão. Tal designação provinha, necessariamente da nespereira comum ou europeia, com o nome científico de mespilus germanica , já que a outra ár…
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