Vida, morte e milagres de S. Torcato (2)

Relíquia de S. Torcato (Museu de Alberto Sampaio)


3. A mesma felicidade, e no mesmo tempo, alcançaram vinte e sete patrícios Bracarenses, que tinham acompanhado ao seu santo Prelado desejosos de tão boa ventura. Os nomes dos principais companheiros eram: Vicente, Martinho, Romano, Félix, Estêvão, Leocádia, Columba, Sabina, Justina, e Cristeta. Uma légua distante do sítio em que se vêem as ruínas da antiga Cidade da Citânia, e meia da célebre Vila de Guimarães se conserva o seu santo corpo em uma Igreja Paroquial, que foi Mosteiro dúplex, em que viveram Religiosos e Religiosas, da Ordem do Glorioso Patriarca S. Bento. Esteve em um sepulcro de pedra, pouco polido, assentado sobre quatro colunas toscas, cercado de grades de ferro, dentro de uma Capela, que está à entrada da porta principal, até o tempo em que foi Arcebispo desta Diocese Bracarense D. Sebastião de Matos de Noronha, pois nele se reformou o sepulcro deste Santo com nova arquitectura, e em forma piramidal, a pedimento e a expensas do Reverendo Cabido de Guimarães, sendo D. Prior daquela insigne Colegiada D. Bernardo de Ataíde.

(Abre-se o seu sepulcro, e se acha seu santo corpo inteiro, e lança sangue)

4. A 14 de Julho do ano de 1637, se abriu o antigo sepulcro, com a assistência do Doutor Rui Gomes Golias, Mestre-Escola da Colegiada, Baltasar de Meira, Arcipreste, Miguel da Silva de Melo, Cristóvão Ferraz, Miguel de Afonseca Arrochela, todos Cónegos e Dignidades da mesma Colegiada. António Coelho, Cura, Paulo Barreto, e o Licenciado Jerónimo Coelho, Reitor, e Vigário da Igreja, e Mosteiro de S. Torcato, com outras inumeráveis pessoas, que a Divina bondade de Deus quis se juntassem para que testemunhassem o prodígio de verem ao Glorioso Santo inteiro, sem alguma corrupção, vestido de Pontifical com Bago, na forma que se venera no seu altar. De tudo se fez um jurídico instrumento, que se conserva no Arquivo da Colegiada. Porém o que nesta ocasião deu maiores motivos para todos os presentes louvarem a Deus em seus Santos,foi o verem que saiu sangue do pé à violência, que o Mestre-Escola fez para lhe tirar, como tirou, um tornozelo, movido de devoção, cuja Relíquia levou para casa manchada em sangue, donde a mandou colocar no Santuário de Guimarães, depois de experimentar muitas enfermidades, que atribuiu a castigo da sua devoção indiscreta. Conserva-se a tal Relíquia com nódoas de sangue entre dois vidros transparentes.
(continua)


Boaventura Maciel Aranha, Cuidados da morte e descuidos da vida, Oficina de Francisco Borges de Sousa, Lisboa, 1761, tomo I, pp. 244-246.


Sobre o mesmo assunto, ler também: 


Comentar

0 Comentários